RATINHOOOOOOOOO!!! A Graphic Novel brasileira Chibata! teria sido um plágio de uma peça de teatro e parece que a Conrad vai pagar a conta.
Uns dois anos atrás eu gravei um Climaxcast histórico com o Algures sobre Heróis e “Heróis” da História do Brasil (veja aqui) e ele me falou muito bem de uma HQ criada pelos quadrinistas cearenses Olinto Gadelha e Hemeterio que tinha como foco a histórica Revolta da Chibata, liderado pelo marinheiro João Cândido em 1910. Inclusive ele fez uma resenha da Graphic no Uarévaa. Veja aqui.
Acontece que César Vieira (pseudônimo do advogado Idibal Almeida Piveta), autor da peça teatral João Cândido do Brasil: A Revolta da Chibata processou a dupla de artistas em 2010 por plágio. De acordo com o blog Cultureba Gadelha e Hemeterio deram uma entrevista ao Portal Garagem Quadrinhos (veja aqui) onde citam a peça de Vieira como uma das fontes da pesquisa pra Graphic:
Hemeterio: Foi um projeto de fôlego. A pesquisa, elaboração do roteiro e desenhos consumiram dois anos, já que a gente só recebeu o OK da editora no começo de 2005. O processo criativo foi bem tranquilo e rápido, na verdade.
Olinto: Nossa história é uma ficção de época, recheada de personagens e eventos reais. Por não ser necessariamente um trabalho documental, certas liberdades foram tomadas no enredo. Ainda assim, optamos por fazer uma pesquisa histórica e visual vasta e espero que isso acrescente um certo sabor — discreto — à obra. Muito me alegraria que alunos aprendendo sobre a revolta da chibata utilizassem nosso álbum para se informar e expandir seus conhecimentos sobre o tema. Essa seria a maior contribuição que poderíamos almejar. Mas vou além, por que não tocar “Mestre Sala dos Mares”, de Aldir Blanc e João Bosco, na sala de aula? Por que não discuti-la? Ou, quem sabe, encenar-se trechos do espetáculo de teatro “João Cândido do Brasil”.
Os artistas e a Editora Conrad haviam sido punidos em primeira instância em 2011. O advogado da editora na época alegou como defesa que a Graphic Novel tinha tirado seu enredo de fatos reais:
“A editora não vê como plágio. São dados históricos, e nós vamos contestar a ação”
Acontece que segundo a parte queixosa a história não era bem assim não. Ao invés de passagens históricas e eventos reais, César Veira acusa Olinto Gadelha e Hemeterio de usarem personagens, lugares e situações fictícias que havia inventado para a peça sem lhe dar crédito. Teriam utilizado na trama até um fictício pub londrino chamado Queen Victory que saiu da imaginação dele:
“A história em quadrinhos jamais poderia ter sido narrada sem que seus autores tivessem conhecimento do meu texto [...] Era um roubo descarado. Personagens que inventei, que não existiram, lugares que inventei, como um bar em Londres, tudo isso agora anda por aí como se fosse de verdade. Com esse negócio de internet, tudo agora tende a virar uma bola de neve, as pessoas acham que nada é de ninguém.”
E agora Hemeterio, Gadelha e a Conrad foram condenados por plágio pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e a editora vai ter que pagar a Vieira R$21,8 mil por danos morais + um valor por danos materiais e ainda terá que publicar três vezes uma retratação num jornal de grande circulação. Gadelha e Hemeterio continuam negando o plágio, alegando que eram duas retratações do mesmo fato histórico com roteiro, estruturas, pontos de vista e interações entre personagens inteiramente diversas.
A editora disse que vai recorrer. Para Vieira a cópia de seu trabalho é escancarada e ele ainda acusa Gadelha e Hemeterio de tentarem passar eventos fictícios como fatos históricos:
A peça é em parte ficcional. Dei ao João Cândido, o líder da revolta, duas namoradas, inventei um bar na Inglaterra, onde ele morou. Tudo o que não existia eles usaram como fatos históricos, em dezenas de páginas. E na defesa alegam que é uma homenagem a mim, mas em nenhum momento meu nome aparece no livro deles.
Que coisa complicada hein? Ou os caras realmente roubaram as idéias dele ou confundiram ficção com realidade. Ambas as alternativas soam estranahs já que nas declarações dos quadrinistas eles adizem que passaram ANOS pesquisando sobre João Cândido e a Revolta da Chibata para criar a Graphic Novel.
Agora a merda mesmo é que esse tipo de coisa é um duro golpe pros quadrinhos nacionais. Chibata! era tudo aquilo que o pessoal queria. Uma boa história em quadrinhos 100% brasileira sobre a rica história do nosso país. Teoricamente poderia mostrar o caminho praquilo que se fala a décadas e décadas, a criação de uma IDENTIDADE pro quadrinho nacional e partir daí quem sabe até movimentar uma indústria ao redor disso.
Infelizmente saber que é um plágio de outra obra é uma mancha não só ao quadrinho em si ou a memória de João Cândido, mas também é um episódio contraproducente que vai fazer mais uma vez a “utopia” do quadrinho nacional andar pra trás. A inciativa da Conrad de publicar uma HQ brasuca já era algo raro que deveria servir de exemplo pro mercado. Imagine como será a reação de outras editoras ao saber do prejuízo – moral e financeiro – dessa condenação?
Afinal, alguém ainda acredita na “força” do quadrinho nacional?
FONTE: Folha de São Paulo.