Tem gente que diz por aí que HQ do Constantine é que nem pizza: até quando é ruim, é bom. Será?
Um ponto da historiografia de John Constantine que é sempre retomado é aquela sua transfusão de sangue dada pelo demônio Nergal, e que deve servir de argumento para milhões de Testemunhas de Jeová ao redor do mundo serem contrários às transfusões publicada originalmente no número 8 da série original do personagem, no longínquo ano de 1988 (foi republicada aqui recentemente em John Constantine: Hellblazer Origens Vol. 2). Para se ter ideia de quão basilar foi esse evento na vida do maldito John Constantine, o arco atualmente publicado na Vertigo da Panini (com Mike Carey nos roteiros) traz a transfusão como plot inicial.
Enfim, neste recente encadernado publicado pela Panini, outra vez o sangue demoníaco que Constantine carrega nas veias é o astro principal. Confira aê na sinopse:
A magia está no sangue de John Constantine. Literalmente. Graças a uma infusão recebida de Nergal há muitos anos, há um poder sombrio misturado com todo o álcool e a nicotina que correm pelas veias do feiticeiro urbano de Londres. Isso já salvou o couro dele algumas vezes, mas também o colocou em encrencas outras tantas. Porém, onde quer que exista poder, haverá alguém para tentar tirar proveito dele. E, enquanto Constantine tem a manha da magia – além de ser um casca-grossa – pra manter o sangue do demônio em xeque, algumas gotas nas veias da pessoa errada podem criar um monstro. Ou uma cidade cheia deles! E basta apenas um acidente pra arremessar John em uma terrível conspiração que pode transformar Londres em uma filial do Inferno!
Entretanto, diferente do evento original, muito do que se seguiu retomando esse lance do sangue demoníaco de Constantine foram merdas. Hellblazer – A cidade dos demônios não é diferente (assim como o recente arco do Mike Carey). Na trama, John sofre um estúpido acidente de trânsito e acaba hospitalizado. Entretanto, no hospital, dois médico-cientistas descobrem o sangue de Nergal no velho bruxo, e começam a fazer experimentos para montar um exército de homens-demônio e conquistar Londres. Sim, o plot é esse mesmo. Cientistas malucos com um plano mirabolante para conquistar a cidade. Tem certeza que eu comprei um gibi do Constantine/Vertigo?
Ah, não, é claro que é Vertigo! Tem sangue, mutilações, sexo e peitinhos, tudo o que faz um legítimo gibi adulto!
Ok, sem ironias agora, Hellblazer – ACdD é uma droga. Uma história de super-heróis genérica, boba, disfarçada com sangue, suor e sacanagem para parecer minimamente adulta. Si Spencer, o roteirista, trabalha há mais de vinte anos na indústria de HQ’s anglo-americana, e esse seu arco em Constantine faz com que ninguém se surpreenda em saber que ele tem bem pouco de relevante na carreira. Tanto que seu trabalho de referência foi um arco de Books of Magick que, exceto por ter nome de uma música foda do Talking Heads (Life During Wartime), não parece muito relevante.
Já Sean Murphy é um cara que desenha muito, isso a gente já sabe desde aquela porcaria que foi Joe, o bárbaro, mas parece que os editores tem o dedo podre para lhe indicar trabalhos. Mesmo quando trabalha com roteiristas já tarimbados (Morrison em Joe) ou em ascensão (Scott Snyder em Vampiro Americano: Seleção Natural), o material nunca é digno de sua arte. Uma pena. É o tipo de coisa que pode mesmo enterrar um grande desenhista. Vamos esperar que ele tenha mais sorte da próxima vez.
Ah, pra fechar o encadernado, há um conto do Constantine escrito e ilustrado por Dave Gibbons. Mas eu estava tão decepcionado com a história principal que não tive saco pra ler. Um dia volto.
John Constantine: Hellblazer – A cidade dos demônios (Hellblazer – City of Demons 1-5 Vertigo Winter’s Edge 3). De Si Spencer (roteiros) e Sean Murphy (arte). Ed. Panini/Vertigo, 132 páginas, R$ 18,90.
Nota: 6 (pela arte e pela sequência do ônibus)
