
A Editora Conrad faz um trabalho quase arqueológico e "desenterra" uma obra que há muito atiça a curiosidade dos entusiastas das Hqs brasileiras: A Garra Cinzenta.

Não sei se vocês sabem, mas além de leitor, sou também um estudioso dos quadrinhos (embora em caráter amador, devo salientar) e isso começou porque toda minha vida adulta (pelo menos até aqui) foi de certa forma uma relação de amor e ódio para com os quadrinhos: Deixei de ler quando a Abril acabou com o formatinho e inaugurou as revistas Premium, voltei a ler quando a Panini adquiriu os direitos da Marvel e posteriormente da DC (ou foi o contrário? Minha mente está me pregando peças), parei de ler em Nossos Mundos em Guerra, voltei a ler em Crise de Identidade, parei de ler em Crise Final e retornei apenas para ler A Noite mais densa, onde mais uma vez deixei de ler quadrinhos (americanos e mensais, apenas para ficar claro). Durante estes períodos "sabáticos" longe das mensais eu não quis me afastar dos quadrinhos totalmente e busquei por fontes fora do eixo americano, me aventurando pelo quadrinho europeu, alguma coisa de manga e, especialmente, pelos quadrinhos nacionais. E foi nessa época que eu comecei a me interessar e estudar mais os heróis brasileiros (pois até então meus interesses pela HQ Br se resumiam aos quadrinhos de terror, que sempre tiveram destaque para mim). E foi nessas "andanças" que eu conheci diversos personagens interessantes (outros nem tanto), e um deles foi o motivo deste post.

O (ou A, se preferirem) Garra Cinzenta merece a atenção dos fãs de quadrinhos por diversos motivos, dos quais elenco três. Primeiro, pelo seu contexto histórico: Garra Cinzenta é um marco nas HQs brasileiras por ser a primeira história de terror nacional; a primeira história de "super-herói" (as aspas estão ali porque, na verdade, ele seria um supervilão) e, salvo engano, a primeira HQ policial brasileira.
Segundo, o personagem é simplesmente muito foda e não deve nada aos grandes vilões clássicos das HQs (tanto no visual quanto nas suas ações). Ouso dizer que é simplesmente o melhor vilão já criado em uma HQ brasileira. E por último, mas não menos importante, temos em "O Mistério da Garra Cinzenta" uma história interessante, inteligente e cativante que permanece relevante até os dias de hoje.

Para quem não sabe, a Garra Cinzenta foi uma HQ seriada publicada em 100 capítulos (cada capítulo sendo de uma página) em um suplemento do Jornal Gazeta de São Paulo em 1937 (não, eu não digitei errado: foi antes mesmo de Superman e Batman). Na história, escrita por Francisco Armond (quase certo um pseudônimo) e desenhada por Renato Silva, uma série de mortes misteriosas cuja única pista era uma carta com o desenho de uma garra (daí o nome do personagem) acaba levando o Capitão Frederic Higgins a confrontar a maior ameaça que ele já conheceu: Um bandido diferente de todos os que ele já enfrentou e com recursos muito além do disponível pelos criminosos comuns (um pouco mais sobre o personagem aqui).
Agora, mais de 70 anos depois, a Conrad traz o personagem de volta com sua história completa (antes ela podia ser encontrada parcialmente na internet) em uma edição fac-símile (ou seja, com os textos originais) e num encadernado bem caprichado que faz jus à relevância histórica do material.

Embora a narrativa em si seja meio datada (dica: quando ler, lembre-se de que as caixas de legenda na parte inferior dos quadros devem ser lidas antes dos diálogos), a história continua muito interessante, e isso de certa forma é lamentável pois, ao comparar O Mistério da Garra Cinzenta com tudo o que foi feito nas HQs brasileiras nas décadas subsequentes, dá para contar nos dedos as obras que o superam. O ritmo é interessante, a trama é cheia de reviravoltas e o vilão é simplesmente aquele tipo de personagem que adoramos odiar. É claro que ela conta com alguns maneirismos típicos da época, como um protagonista com a personalidade padrão dos heróis da Era de Ouro e algumas caixas de legenda redundantes (em conjunto com o quadro); mas nada que tire o brilho da história.

Ah, outra coisa que você talvez possa estranhar, caso se apegue à escrita correta, é a ortografia. Como a história vem antes do acordo ortográfico de 1945/46, há muitas diferenças de grafia entre certas palavras em relação à língua portuguesa atual (termos como êle, theatro, policiaes, entre vários outros). Então não se assuste, pois não são erros, estes são apenas os textos originais.

Em termos editoriais, a Conrad fez um trabalho de pesquisa muito bacana, então quem não conhece o personagem vai poder entender, não só sua criação, mas os motivos pelos quais a história levou tanto tempo para ver a luz do dia novamente. A edição está bem caprichada e vale o valor meio salgado (se eu não me engano, paguei R$ 46,00 pelo encadernado).
Para quem é fã de quadrinhos, curte uma boa história e se interessa por conhecer um pouco mais da história dos quadrinhos brasileiros, vale a pena conferir esta obra, que além de clássica tem valor de documento histórico.

Nota 10
(mas eu sou suspeito pra falar, pois esperava esse material há muito tempo; coloque então uns 9,5 você não sendo tão eufórico)
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