… Uma propaganda sobre quadrinhos para as redes sociais feita por quem, aparentemente, não entende chongas de rede social.
No último dia 24, a Ariel, marca de sabão de lavar roupa, lançou uma série de peças de propaganda para as redes sociais pretensamente genial e inovadora: batizada de “Eu torço sim”, a campanha traz uma série de tirinhas em quadrinhos feita pelo Fábio Moon sobre a relação povo brasileiro/Ariel/torcer pelo Brasil no futebol para ser lançada nas redes sociais (leia-se Facebook e o Twitter, aquela ferramenta inútil).
Veja aí as propagandas:
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Uma ideia boa? Sim.
Mas que execução de merda, hein?
Primeiro, não sei quem foi o Jênio que fez o inoxidável trocadalho do carilho entre “torcer” para o Brasil e “torcer” a roupa molhada.
Também não sei quem achou que umas tirinhas bobas dessas iam viralizar e circular pela rede: será que confiaram exclusivamente no poder difusor dos fãs do Moon ou os fãs do Ariel (ehehehehehe) para fazerem essa água de batata circular?
Mas o grande lance é o seguinte: acabou que a peça está circulando. Não pelos fãs do nosso amigãozão Moon, nem pelos entusiastas do grande sabão Ariel, mas justamente por alguns seguimentos mais aguerridos ligados ao feminismo, que entenderam as tiras como bastante sexistas na separação homens/mulheres. Sobretudo a última peça, que relaciona o ato de lavar roupa, uma atividade quase exclusivamente doméstica, a uma mulher.
Por que não um homem “torcendo” a camisa após “torcer” para o Brasil? Por que quando a participação feminina não é servil (tiras 1 e 4), ela é ligada ao sexo (tiras 2 e 3)?
Nas palavras de uma internauta: “gente, quem criou essa tirinha? estão péssimas, machistas, nojentas. vai sujar o nome da marca e não vai ter ariel que limpe”
Bem, temos aí dois problemas de leitura, pelo menos de onde vejo: um por parte da campanha em si, outra por parte dos próprios leitores.
Vou começar pelos leitores: aparentemente ninguém percebeu que a personagem principal da campanha é justamente a mulher. Calma, não só porque “lavar roupa é coisa de mulher”, mas talvez porque Ariel seja nome feminino e a marca tentou se personalizar, projetando-se na figura feminina do casal protagonista. Ok, não sejamos ingênuos e tenhamos em mente que o sabão Ariel provavelmente se chama “Ariel” justamente por “lavar roupa ser coisa de mulher”, e por isso toda a sua fanpage é abarrotada de materiais voltados ao público feminino.
A mulher é Ariel. É essa “mulher/sabão em pó” quem quer torcer (a roupa) e torcer (pelo Brasil). Parece que ninguém percebeu. Sim, Moon e a marca também não ajudaram: era pedir muito que a personagem fosse chamada “Ariel” por alguém nas tiras?
Aqui acontece o erro de leitura da produtora e, obviamente, do próprio Fábio Moon: a mulher não podia ser nomeada, porque as tiras do Moon são assim, indiretas, pseudo-filosóficas, abarrotadas de personagens sem nome. Ou seja: se coloca nome na mulher, descaracterizava o trabalho do Moon.
Percebe o erro de leitura da dupla Moon/Ariel? Oras, só de ser uma série de tiras-propaganda, o trabalho já está descaracterizado! Ou será que eles acharam que o público das tiras do Fábio Moon (seja na Folha ou nas interwebs) era o mesmo público que a propaganda atingiria? Sério mesmo que nenhum Jênio das social mimimidia sacou que precisava de uma contextualizada ou melhor, uma adaptada?
No fim, é só uma propaganda ruim mesmo – nem é, por si, machista, mas evidencia um machismo em que permanecemos imersos há bastante tempo (oras, num mundo ideal uma mulher lavando roupa num comercial seria tão óbvio e natural quanto um homem fazendo a mesma coisa). Sim, talvez o machismo seja anterior, muito anterior, a ela própria.
É só um petardo, um manifestação de como a publicidade anda defasada. Quer usar quadrinhos (porque tá na moda) mas não entende nada de quadrinho. Quer usar a social mimimidia mas não entende nada de social media.
E vão surgindo campanhas de sabão e divulgações infantilóides de filmes…
(ah, e pra quem, como eu, estranhou esse esquema 4-2-3-1, é o bom e velho “banheirista”, ou 4-5-1)