
Não, você leu errado: não é "Chinês de Tóquio", é "O Chinês Americano"!

Um garotinho, filho de imigrantes chineses, tentando se adaptar à escola (e o mundo social juvenil) americana. Do outro lado, um jovenzinho da terra, popular, membro do time de basquete e amigo das meninas mais bonitas da escola - mas cujo primo Chin-Kee, que encarna o pior do estereótipo de chinês, rotineiramente vem destruir sua reputação escolar. E, paralelo a tudo isso, a narrativa da velha lenda chinesa sobre o rei macaco que queria ser deus.

É trançando essas três histórias paralelas que Gene Luen Yang produziu uma HQ bacana, divertida e leve (mas sem deixar de ser séria) sobre um tema bastante difícil para qualquer pessoa diferente do tipo hegemônico - a adaptação e aceitação do diferente.
Jin Wang, o personagem principal, começa sua narrativa no exato momento em que sua família decide deixar o bairro americano de Chinatown. Reduto de imigrantes chineses, em Chinatown Jin estava entre iguais todo o tempo, situação que muda quando ele se percebe numa típica escola americana, onde a professora sequer sabe pronunciar seu nome. Já Danny, o garoto da segunda história, é praticamente um ariano puro: loiro, olhos claros, popular... Mas sofre à cada visita de seu primo Chin-Kee, que se veste, fala e se comporta como um típico chinês de filme amerikkano, que troca os "R's" e "L's", gosta de carne de cachorro e gato e assedia as jovens garotas. Já o Rei Macaco da Montanha Flor e Fruto apresenta uma outra passagem da lenda que inspirou Dragon Ball e aquele filme do Jackie Chan com o Jet Li (tô com preguiça de procurar o nome).

Numa narrativa capaz de atingir adultos e crianças com muita facilidade, Gene Luen coloca o diferente e "os iguais" frente a frente. Porém, ao invés de fazer como tantos filmes, músicas seriados, ele não se coloca como um observador externo, mero espectador: ele mesmo um sino-americano, seu enfoque sobre as diferenças está situado exatamente nos olhos do diferente (mesmo que você não perceba isso). O Chinês Americano é praticamente uma fábula moderna sobre aquilo que Paulo Leminski se referia quando escreveu que "Isso de querer ser exatamente o que a gente é, ainda vai nos levar além". Inclusive, essa sensação de fábula é reforçada mesmo pela arte de Luen Yang, num estilo linha-clara cuidadoso e bonito de se ver. E, se escrevo mais do que isso sobre a trama, entrego o jogo e ferro com tudo.
O chinês americano (American Born Chinese) foi lançado aqui em terra brasilis em 2009 pelo selo Quadrinhos na Cia., da Cia. das Letras (que tem sido uma editora do cacete pras HQ's) e, não sei porque cargas d'água não gerou muito barulho. Talvez por ter dividido os holofotes com Retalhos, de Craig Thompson (cuja presença do autor no país chamou atenção) e os álbuns de Tintin, então em franca divulgação. Fato é que, sendo uma obra tão simples e ao mesmo tempo tão incrível, nós só podemos agradecer ao formato de quadrinhos para livrarias, que permite que as obras fiquem por mais (muito mais) tempo acessíveis ao mercado consumidor. Afinal de contas, mesmo tendo lido o exemplar da Gibiteca Municipal, O Chinês Americano merece (e tem reservado) lugar na prateleira. Não é qualquer obra que consegue trabalhar um tema espinhoso como esse (e cada vez mais comum nestes tempos de globalização e politicamente correto) com tanta capacidade, simplicidade e delicadeza. Convém citar que lá fora a obra chamou mais atenção, sendo indicada ao National Book Award e sendo a primeira HQ a ganhar o prêmio Michael L. Printz Award de literatura juvenil.

E que atire a primeira pedra quem não se ver, nem um pouquinho só, na trama...
Nota: 8,5
O Chinês americano, de Gene Luen Yang. Quadrinhos na Cia., São Paulo: 2009. 240 páginas, colorido. Entre R$47,50 e R$52,50.
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