Django Livre, novo filme de Quentin Tarantino ainda nem estreou por aqui, mas já vem causando polêmica nos EUA.
Tudo começou quando o diretor Spike Lee criticou abertamente seu colega Quentin Tarantino numa entrevista a Vibe Magazine e disse que não assistiria Django Livre:
“Não vou assistir ao filme. Tudo o que posso dizer é que ele é desrespeitoso aos meus ancestrais. Mas esse sou eu… não estou falando por mais ninguém. A escravidão nos Estados Unidos não foi um western spaghetti de Sérgio Leone, mas um holocausto. Meus ancestrais foram escravos, roubados da África. Eu os honrarei.”
Daí vários fanboys do Tarantino logicamente saíram em defesa dele e xingaram muito falaram no twitter de Spike Lee que Django era só um filme, ao que Lee teria respondido citando um polêmico filme de D. W. Griffith dos anos 20 onde a Ku Klux Klan era mostrada como um grupo de heróis e onde os negros eram retratados como assassinos e estupradores:
“Errado. O Nascimento de uma Nação levou ao linchamento de negros. A mídia é poderosa. NÃO DURMA. ACORDE.“
Bom, em primeiro lugar eu entendo o Spike Lee. Acho que foi mesmo um Holocausto e a mídia dificilmente trata da mesma forma por exemplo a escravidão dos negros nos EUA e o que os nazistas fizeram com os judeus na Alemanha. Mas, pelo menos a princípio – já que eu não vi o filme ainda – discordo sobre o Django Livre. Lembro até que ele arrumou uma confusão com o Clint Eastwood por uma razão parecida.
Mostrei o que o Spike Lee disse pro Poderoso Porco e ele tem mais ou menos a mesma opinião que eu, mas expressou melhor:
” Eu prefiro ver por outro ponto: é claro que a escravidão americana não era um western leoniano. Mas ela existiu, e estava viva, na época da conquista do oeste, certo?
A conquista do oeste virou um gênero de cinema. Nesse gênero, a escravidão do período é bem pouco explorada geralmente. Muitas vezes é invisibilizada, inclusive. Tarantino tá propondo um western com um protagonista negro e que leva em conta o contexto escravagista do período. O que o Spike Lee queria? Um western protagonizado por um negro que ignorasse o tema da escravidão? Ou a simples inexistência de um western com negro à frente?
Acho que, o aparente cuidado do Tarantino é o suficiente para eu querer ver esse filme. Se o Spike Lee não quer ver, tudo bem. Mas não precisa se justificar, ainda mais com esse tipo de justificativa furada e apriorística… “
Bom, o Tarantino falou que não ia perder tempo com o Spike Lee… mas em compensação se meteu em OUTRA POLÊMICA com outro cineasta. Em entrevista ao TheRoot.com Tarantino investiu contra John Ford, o “pai” do gênero western:
“Um dos meus heróis do faroeste americano não é John Ford, obviamente. Para dizer o mínimo, eu o odeio.“
Agora vem A IRONIA. Aparentemente Tarantino despreza Ford porque ele trabalhou como ator em O Nascimento de uma Nação. Durante a entrevista ele chega a debochar da cena em que Ford faz um dos membros da Ku Klux Khan e diz que se inspirou nela pra criar uma sequência de Django Livre.
Pior que eu não sei se o Tarantino é MUITO ignorante, ou se ele na verdade é MUITO inteligente. Sim, porque em pleno período de estréia do filme ele se esquivou de uma discussão com um cineasta que milita pelos direitos dos negros, e ao mesmo tempo critica um outro cineasta – já falecido – que tem um histórico conservador.
Cara, John Ford foi uma das personalidades mais complexas que já pisou em Hollywood… e eu não vou defendê-lo aqui. Porque ele era um tremendo filho-da-puta! Se estivesse vivo já teria chamado o Spike Lee de chorão e o Quentin Tarantino de cuzão! HAHAHAHAHAHAHA!!!
Mas entre todos os seus defeitos como pessoa – e eram muitos – ele não racista. Inclusive quem assistiu ao documentário do Peter Bogdanovich sobre o John Ford sabe que ele era capaz de sacanear atores chamando eles de racistas na frente dos colegas só pra trollar. Olhando por esse lado, aliás, não consigo culpar muito o Tarantino, caso ele esteja se aproveitando da imagem do Ford pra promover seu filme.
Mas a participação do Ford em O Nascimento de uma Nação quando era jovem não retrata NADA da sua grande obra como diretor, que é repleta de mensagens anti-raciais.
Ele criticou abertamente o racismo numa época em que o tema era tabu no Cinemão, especificamente através do filme Audazes e Malditos (Sergeant Rutledge) de 1960, estrelado por Woody Strode – um ótimo ator negro que trabalhou em alguns dos meus faroestes favoritos – que vive o papel titulo, um oficial da cavalaria que vai a julgamento acusado pelo estupro e assassinato da filha de um oficial superior e pelo assassinato do próprio oficial, que tentava proteger a filha.
Lidando com um tema espinhoso, Ford fez de Audazes e Malditos um clássico – a talvez o primeiro western que se passa num tribunal – que até hoje é uma obra muito atual.
Veja o FILME COMPLETO abaixo:
O Porco passou um link com um texto que fala de outros faroestes protagonizados por atores negros. Confira aqui.