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Dez anos sem Flávio Colin

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Há exatos dez anos, o Brasil perdia um de seus quadrinistas mais originais e invetivos…

Pode ser que a geração leite com pera e ovolmaltino não conheça o trabalho, nunca tenha lido nada do Flávio Colin ou, sabendo de quem se trata, sendo apresentados ao trabalho, podem vir a soltar um “Aí, que feio, prefiro o Jim Lee”. Pode ser. Admito que não é uma arte para qualquer paladar – provavelmente só para os refinados.

Nascido em 1930, Colin começou a desenhar HQ’s na RGE em 1956, trabalhando em materiais gráficos diversos e versões nacionais de personagens gringos, como o Cavaleiro Negro e Águia Negra, mas seu grande trabalho nos primeiros anos foi “As aventuras do Anjo”, adaptação de uma radionovela policial. Nela aproveitando-se de particularidades contratuais, Colin inseriu ideias próprias, começando pela ambientação – na radionovela, a história se passava na gringa, nas HQ’s de Colin, no Brasil. Isso inclusive dava sinais de uma postura ideológica forte não só no trabalho quanto nos discursos de Colin: a valorização do Brasil e de seus temas.

Como disse, dono de um traço que pode não agradar a todos (sobre isso, o próprio escreveu: “Cultivo um traço próprio, que identifica facilmente o meu trabalho. Jamais pretendi agradar ‘a gregos e troianos’. Desenho por prazer, com a ‘alma’ e sempre preocupado em valorizar os roteiros que recebo.”), Colin apontava, como referências, gente do quilate de Alex Raymond (Flash Gordon), Milton Cannif (de Terry e os Piratas), Burne Hogarth (Tarzan) e, talvez a mais evidente, Chester Gould, de Dick Tracy.

Trabalhou em vários gêneros de quadrinhos, se destacando nos trabalhos com o quadrinho de terror, dado seu pleno domínio do preto e branco. Como a maioria dos desenhistas de profissão, a certa altura largou as HQ’s e foi viver de publicidade, passando doze anos fazendo exclusivamente isso. Engraçado é que, ainda que Colin, o artista, tenha largado as HQ’s pela publicidade, sua arte não fez o mesmo movimento, já que acabou fazendo material para o refrigerante Fanta, quer era veiculado… nas HQ’s!

Depois do “exílio”, Colin voltou a fazer HQ’s porque, segundo dizia, era o que realmente gostava (“Olha, quadrinho pra mim é uma coisa fantástica. Com certeza é um dos maiores veículos de comunicação. É imagem e texto sucinto, que você diverte e instrui. No Brasil, um país de semi-analfabetos e analfabetos, o quadrinho tem uma importância muito grande, mas é pouco usado.”). Dessa sua retomada (e já próximo do fim) saíram materiais célebres e premiados como Fawcett (com roteiros de André Diniz e vencedor do Ângelo Agostini), Curupira, Fantasmagoria e Estórias Gerais, estes dois últimos com roteiros de Wellington Srbek. O Estórias Gerais chegou a ser lançado pela Conrad, numa edição caprichadíssima, e agora revê a luz do dia, pelo pessoal da Nemo.

Inclusive, é em Estórias Gerais que eu vejo todo o potencial tanto do talento quanto das convicções de Flávio Colin: seu traço único, carregado, devedor do estilo das capas de cordel, é perfeito para a história de cangaço e misticismo de Srbek. A sensação é de que, sem grana e na raça, Srbek e Colin deram, sobre o mesmo tema, seu Grande Sertão: Veredas em quadrinhos.

Simples, um pouco seco (pelas coisas que se lê, pelas declarações) Colin foi um grande brasileiro que o Brasilzinho mainstream insiste em tentar apagar. Mas a arte não deixa. Afinal, foi sempre esse o recado que deixou para quem veio depois: trabalhe! “Meu recado é de incentivo a todos que estão escrevendo e desenhando HQs. Que aprimorem sempre o seu trabalho e dêem preferência aos temas e figuras do Brasil. Que se unam corajosamente, com o objetivo de derrotar o mais famoso herói brasileiro: o famigerado ‘Copyright Kid’. Que não lhes faltem ‘engenho e arte’”

Um viva ao grande Flávio Colin!



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