
Existe um mundo lá fora, longe de Marvel, DC, Image... Nesse mundo, essas três não chegam nem a fazer sombra (anh? Sacaram? Sacaram? Três sombras... - Nerd Reverso mode off)...
Vira e mexe, quando eu publico um review, os comentários enchem de mimimizentos, dizendo que eu sou um rabugento, um saraiva, que fica falando mal do personagem que respondeu a cartinha dele, digo, do seu autor preferido.
Vou te confessar, eu chego a me questionar quando leio esses comentários. Será que de fato me tornei um velhaco que não gosta de nada, que acha tudo ruim, chato, bobo e feio? Será?
Aí me cai nas mãos um álbum como Três Sombras, e eu percebo que não, não virei um velho rancoroso - eu só estava era olhando pro lado errado!
Antes d'eu falar de Três Sombras, segue a sinopse do álbum, tirada diretamente do site da Companhia das Letras:

Joachim e seus pais levam uma vida tranquila em uma pequena casa no campo. A aparição de três sombras no alto de uma colina, no entanto, corrói a harmonia da vida em família e enche os pais de dúvidas. Seriam viajantes? Por que estão rondando a casa? A cada tentativa de aproximação, as figuras misteriosas desaparecem. Logo, eles percebem que as sombras estão ali para buscar Joachim. Recusando-se a aceitar esse fato, o pai foge com o filho em uma viagem febril e desesperada, sempre com as sinistras sombras em seu encalço.
Joachim deixa assim seu mundo idílico pela primeira vez para viajar por terras hostis em um navio precário, onde conhecerá um mundo cercado de adultos trapaceiros e imorais. Três Sombras é um romance de aventura, com contornos épicos, e que explora sutilmente questões de ordem filosófica e moral.
Cara, eu sinceramente fico pensando por onde abordar Três Sombras? Pela arte? Pelo roteiro? Pela edição? Pelo conjunto da obra?

Se falar da arte, preciso passar pelo fato de que Cyril Pedrosa trabalhou em animações da Disney como O Corcunda de Notre Dame e Hércules, e que seu traço tem toda a cara, quase um selo de qualidade, do estilo gráfico das (falecidas) animações 2D da Disney. Mais do que isso, é belíssimo o movimento que ele consegue imprimir às figuras, a expressividade das cenas que desenha (quando Louis e Lise, os pais de Joachim, se separam... É movimento puro, é incrível a expressão tônico-postural que ele coloca em Lise). Seu estilo, às vezes graciosamente tosco - como se fosse desenhado a carvão direto, sem arte-final e sem borracha - lembrou-me muito Jules Pfeiffer em O Homem no Teto: dá a mesma impressão de relato pessoal, de coisa feita às pressas, não por descuido, mas por urgência de não deixar nenhum detalhe do sentimento escapar.

E por falar em "relato pessoal", é bacana que Cyril esteja fazendo uma alegoria - eu entendo como a inevitabilidade da morte o seu tema central, porque a sua narrativa, a metáfora que ele escolheu para servir de fio alegórico funciona perfeitamente. No meio do caminho você se pega pensando, torcendo pelo final feliz, para logo em seguida pensar: e se der certo? Não tem jeito de dar certo! E mesmo quando você pensa que ele está se distanciando do tema, mostrando personagens incoerentemente irreais, ele dá a volta e te lembra que não dá pra falar da morte sem falar da vida, e, sinto lhe informar, a vida é surrealmente incoerente mesmo.

Pra falar da edição, acho que nem falo mais porque já está virando lugar comum elogiar o trabalho da Quadrinhos na Cia/Companhia das Letras. Não tem bastado elogiar o trabalho deles, a qualidade das publicações, a gente precisa também elogiar o trabalho de escolha de material a ser traduzido e o senso de oportunidade de seu lançamento - ano passado, quando o FIQ tava bombando, a Quadrinhos na Cia. não só lançou seu Três Sombras, como trouxe intermediou a vinda do próprio Cyril Pedrosa (quem bancou a presença do cabra foi o próprio FIQ. Valeu pela correção, Afonso!). O tipo de coisa que outras editoras, muito maiores no que tange a quadrinhos, não têm a sacada de fazer - ou têm o amadorismo de não fazer.

No conjunto da obra, Três Sombras é um dos álbuns de quadrinhos mais bonitos que já li. É terno, bem executado, bem editado. E se no resto da minha vida é bem possível que eu leia coisas ainda mais bonitas, neste ano de 2012 eu já acho pouco provável...
Três Sombras (Trois Ombres). De Cyril Pedrosa, Quadrinhos na Cia, 2011. 272 páginas, R$ 39,50.
Nota: 10

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